Em Glória ou Como Penélope Morreu de Tédio ressoam temas e personagens da epopeia grega, mas este projecto olha de frente para a psicopátria lusa. Chega-nos com aquele sentido de urgência que caracteriza grande parte da novíssima dramaturgia portuguesa, território em expansão de onde emerge o nome de Cláudia Lucas Chéu, actriz que se tem aventurado na pele de autora e encenadora. Neste solo a várias vozes interpretado por Albano Jerónimo, colocam-se em tensão aspectos do modo atávico de ser português – a transmissão do medo, a paralisia da espera, a recusa do luto –, espécie de variação crítica do mito de D. Sebastião feita a partir de personagens inspiradas na Odisseia de Homero. Há uma figura, Pathos, que compõe um hino dedicado à espera da mãe, e esse filho e essa mãe poderiam chamar-se Telémaco e Penélope, condenados a desesperar pelo regresso de Ulisses a Ítaca, de onde partiu para combater na guerra de Tróia. Em Glória, a espera é um bem precioso que convida ao silêncio e à reflexão, mas é também um prejuízo, porque é o compasso vazio entre o passado (as memórias vividas) e o futuro por vir que idealizamos nas nossas cabeças.
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Este projecto foi escrito para ir a cena. Este projecto fala da espera, mas não quer fazer-se esperar. Fala também da não-inscrição, mas quer com toda a certeza inscrever-se no panorama teatral nacional. É a oportunidade de reflectir sobre a possibilidade de podermos desacelerar, num mundo que circula cada vez mais veloz e se consome de forma descartável. Esperar o tempo certo para que a fruta ou o vinho amadureçam, tornando-os especiais de reserva; e de como isto se transfere para as relações humanas. Em Glória, queremos também reflectir sobre o porquê de cada vez mais não nos inscrevermos na sociedade e de como isso se espelha no discurso e no corpo de quem vive aqui e agora. Segundo José Gil (filósofo português residente em Paris), os portugueses não fazem o luto e com isto prolongam ad nauseam a espera, como se as coisas não estivessem realmente inscritas no presente, mas se inscrevessem em alguma coisa que ainda está para vir. Subscrevendo totalmente esta ideia, escrevi Glória.
texto e encenação Cláudia Lucas Chéu
Cláudia Lucas Chéu
texto e encenação Cláudia Lucas Chéu
espaço cénico e figurinos Ana Limpinho
espaço sonoro Vítor Rua
desenho de luz Nuno Meira
realização e edição vídeo Sérgio Graciano
...direcção de fotografia Miguel Manso
assistência de encenação Solange Freitas
interpretação Albano Jerónimo
participação especial Daniel Ferreira/Diogo Freitas; Grupo de Teatro Comunitário As Avozinhas de Palmela (direcção Dolores Matos)
co-produção AJ Produções, TNDM II, TNSJ
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