Se não tivesse sido o introdutor do cinema em Portugal, realizando os primeiros “quadros” fílmicos do país, Aurélio seria seguramente evocado como participante dinâmico do 31 de Janeiro, como mação convicto da benemerência arriscada e, naturalmente como fotógrafo. O seu interesse pela arte da divulgação visual parece nascer como corolário do seu gosto estético: cultivava uma caligrafia floreada e talvez por isso foi encarregado de endereçar os convites para as personalidades do 31 de Janeiro, ensaiou o cinema e a fotografia e tentou um progresso modernista da publicidade, um cartaz luminoso e animado na Praça D. Pedro.
Republicano convicto e actuante associava a sua crença no serviço social ao progresso das Luzes, essas Luzes que o século XIX queria como suas. Percorrer os interiores que este fotógrafo de rua e de multidões distinguiu, leva-nos à sua fé nesse progresso que passa pelo ideal de saúde e sanidade da burguesia esclarecida, o desporto, a ginástica, os passeios salutares que completavam o montanhismo e, naturalmente o passeio de bicicleta que aliava tantas vezes a atenção fotográfica. Por isso mesmo a foto do Velo-club em Santa Catarina, dos Cirne Madureira acumula essa ânsia de ar livre, olhar fotográfico e elegância de instalações que o fotógrafo prezava.
Mas a estes primórdios do culto do corpo, Aurélio juntava a luta porfiada pela cultura do espírito que era ainda um esforço do programa republicano: não perde uma exposição de arte, um estúdio de artista ou a inauguração dessa pequena obra-prima que era a Livraria Lello. Cidadão da sua cidade, Aurélio fazia de si cidadão do mundo.
Maria do Carmo Serén
Aurélio Paz dos Reis (1862-1931)
Fotógrafo portuense, introdutor do cinema em Portugal e respeitável cavalheiro, a participação na revolta de 31 de Janeiro valeu-lhe dois encarceramentos neste mesmo espaço onde, ironicamente, hoje se encontra o seu extraordinário espólio.
Floricultor de profissão, tinha a sua loja na actual Praça da Liberdade. A conhecida confeitaria Ateneia foi outrora a Flora Portuense onde Aurélio da Paz dos Reis cuidava das suas dálias. Com ligações à Maçonaria, o autor foi ainda vereador e presidente substituto da Câmara Municipal do Porto e cooperou com inúmeras instituições culturais e de beneficência. Entre 1918 e 1919 perde tragicamente três dos seus quatro filhos. Hilda e Horácio não resistem à pneumónica e Homero morre em França no final da 1ª Guerra Mundial. Restou Hugo que passaria toda a documentação para o seu filho, também ele Hugo, que viria a depositar o espólio do avô no CPF em 1997.
http://www.cpf.pt/
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